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02 DE SETEMBRO DE 2009, QUARTA-FEIRA
FONTE: DN
POR: Mário Jorge
O programa do PSD tem um objectivo: destruir o Serviço Nacional de Saúde
"A leitura do programa do PSD relativo ao sector da saúde permite verificar que há uma perspectiva assumida de proceder à liquidação integral do Serviço Nacional de Saúde (SNS)."
Ao longo do seu texto não existe uma única referência ao SNS e às carreiras dos profissionais de saúde, havendo uma clara recuperação dos conceitos e da terminologia que presidiram à desastrosa reforma empreendida no final da década de 1980 por Thatcher na Grã-Bretanha e que conduziu à destruição do NHS britânico, até aí considerado como um modelo internacional de garantia da universalidade de cuidados de saúde.

A “liberdade de escolha pelo utente… dentro ou fora do sistema públicoâ€, “aumentando a competição e, consequentemente, a qualidade dos serviços prestadosâ€, “uma separação funcional, e porventura orgânica, entre o financiamento, a prestação e a regulação da saúde que permita simultaneamente a maior abertura ao mercado concorrencial…†e o “retomar outras parcerias público-privadasâ€, são conhecidos conceitos que enquadraram a política do governo conservador de Thatcher e que, por sua vez, caracterizam desde há décadas o sistema de saúde americano.

Estes eufemismos pretendem, tal como já aconteceu no passado, esconder da opinião pública um objectivo bem definido e de consequências desastrosas que é a destruição gradual dos serviços públicos de saúde e a transformação deste direito constitucional num qualquer bem de consumo dependente da capacidade económica de cada cidadão, ou seja, quem tem dinheiro paga os cuidados de saúde que necessita e quem não o tem fica abandonado à evolução natural da doença.

Estas propostas mostram que a actual direcção do PSD não aprendeu nada com a actual e preocupante crise internacional, ao insistir em modelos que, de forma inquestionável, estão na sua origem.

É surpreendente que no nosso país sejam apresentadas estas propostas ao mesmo tempo que no país onde este modelo impera há décadas, o seu presidente, Barack Obama, esteja a desenvolver esforços para proceder à sua alteração no sentido de criar um sistema universal de cuidados de saúde, de modo a impedir que continue a crescer o número dos actuais 50 milhões de americanos que não têm acesso a quaisquer serviços de saúde.

O conceito apresentado nesse programa de separação funcional e orgânica entre o financiamento e a prestação constitui o elemento basilar que tem presidido em vários países à efectiva e integral privatização dos serviços públicos de saúde e à transformação deste direito humano e civilizacional num negócio a favor de grandes consórcios privados.

Quando esse programa estabelece que “reavaliaremos a possibilidade de celebrar novamente acordos de gestão de serviços de saúde com entidades do sector social ou do sector privado, bem como de retomar outras parcerias público-privadasâ€, estamos perante um novo facto clarificador das efectivas preocupações comerciais desta abordagem.

Depois do falhanço da experiência do acordo de gestão privada do Hospital Amadora/Sintra que levou à sua não renovação e consequente retorno à gestão pública, a actual direcção do PSD insiste neste modelo e até pretende alargá-lo.

Por outro lado, a posição assumida de retomar outras parcerias público-privadas ignora completamente a experiência existente na Grã-Bretanha desde há mais de 10 anos, onde este modelo tem conduzido a resultados desastrosos e a cortes sucessivos nos serviços prestados aos respectivos cidadãos.

O programa global da actual direcção do PSD aparece assumidamente subordinado à velha máxima do “menos Estadoâ€, mas esconde que todos estes conceitos que apresenta só são viabilizados à custa dos dinheiros públicos.

Então, o “menos Estado†é para quem? Para os cidadãos ou para os interesses privados que são viabilizados pelo dinheiro dos contribuintes?

Relativamente à suposta “liberdade de escolhaâ€, quem não tem recursos para pagar integralmente os cuidados de saúde de que necessita tem liberdade de escolher o quê?

Além disso, essa liberdade de escolha para outros cidadãos nunca esteve em causa no nosso país.

O relatório mundial da OMS sobre os sistemas de saúde referiu que em Portugal, em 2000, as despesas públicas de saúde no total das despesas nacionais de saúde eram de 57,5%, enquanto que, por exemplo, na Alemanha eram de 77,5%, na Bélgica de 83,2%, na França de 76,9% e na Suécia de 78%.

Neste contexto, é possível verificar que a existência do SNS no nosso país nunca foi sinónimo de qualquer perspectiva estatizante e que as pessoas que têm maiores recursos económicos sempre puderam escolher os serviços onde pretendem ser tratados.

Assim, o que significa em termos práticos e objectivos a consigna neoliberal de “menos
Estado�

Naturalmente, que o ainda “menos Estado†do que estes números revelam seria a destruição integral do SNS.

É curioso que estes círculos ideológicos clamem por “menos Estado†quando se trata de assegurar a viabilização dos negócios privados, mas quando estão confrontados com os resultados desastrosos da sua gestão cheguem a ficar roucos de tanto apelar ao Estado para que evite a sua falência, como se tem assistido em vários países, incluindo o nosso, com múltiplas entidades bancárias e seguradoras.

Por último, uma referência à medida proposta no programa sobre “ aumentar a eficiência e reduzir o tempo médio em lista de espera…â€.

É até irónico que apareça esta medida depois daquilo que foi a gestão das listas de espera para as cirurgias do governo anterior pela acção do então ministro Luís Filipe Pereira, que eliminou o programa de recuperação destas listas e substitui-o pelos chamados “vales-cirurgiaâ€.

O resultado prático desta medida foi o contínuo agravamento destas listas e a criação destes vales, com o objectivo de encaminhar preferencialmente os doentes para as entidades privadas, nada resolveu.

Assim, a curto prazo, os eleitores terão a palavra decisiva em torno desta importante e crucial matéria: ou optam pela manutenção do direito constitucional à saúde corporizado pelo SNS ou aceitam que a sua saúde seja transformada numa mercadoria para viabilizar os negócios privados daqueles para quem a vida humana nada representa.

Mário Jorge Neves,
médico


 

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