20 DE SETEMBRO DE 2009, DOMINGO
O 29 de Setembro
Cipriano Justo
"O que vai tornar diferentes estas eleições de todas as outras é o 29 de Setembro. O dia a seguir a terem-se passado em revista os cenários possÃveis de governabilidade do paÃs. Que, excluindo todos os restantes, são basicamente três. Um, que não ofereceria qualquer dificuldade para os conúbios – uma coligação de direita. Outro, para o qual já há padrinhos, alianças encomendadas e copo de água reservado – o bloco central. O terceiro, porventura o de mais difÃcil exequibilidade, mas nem por isso impossÃvel – uma convergência de esquerda."
O que podem tornar diferentes as eleições de 27 de Setembro de todas as outras que se realizaram para a Assembleia da República? Pelas declarações das lideranças partidárias, nada. Tudo as separa, nada as aproxima. Mas isso é o que na gÃria costuma designar-se por fruta da época. O que vai tornar diferentes estas eleições de todas as outras é o 29 de Setembro. O dia a seguir a terem-se passado em revista os cenários possÃveis de governabilidade do paÃs. Que, excluindo todos os restantes, são basicamente três. Um, que não ofereceria qualquer dificuldade para os conúbios – uma coligação de direita. Outro, para o qual já há padrinhos, alianças encomendadas e copo de água reservado – o bloco central. O terceiro, porventura o de mais difÃcil exequibilidade, mas nem por isso impossÃvel – uma convergência de esquerda.
Convergência de esquerda que pode ter uma amplitude variável consoante o que os partidos intervenientes estiverem dispostos a negociar. Desde uma partilha de responsabilidades governativas, o que obrigaria do lado do PS a uma revisão aprofundada de algumas das polÃticas seguidas pelo actual governo e do lado do BE e do PCP a encontrar linhas de compromisso aceitáveis para o que têm sido as suas exigências, até um acordo com incidência parlamentar de que constariam os aspectos que estes partidos considerassem mais relevantes para merecerem a sua assinatura. Em qualquer uma das versões seria indispensável a participação e o escrutÃnio dos principais actores sociais, principalmente do movimento sindical, cuja intervenção é inquestionável numa solução com esta dimensão polÃtica.
Naturalmente que a polÃtica económica está no centro de todos os questionamentos entre a esquerda e o centro-esquerda. Quem devem ser os principais beneficiários das mais valias da actividade produtiva é o que tem sempre separado estas duas famÃlias polÃticas. Porventura mais do que as polÃticas sociais, onde previsivelmente seria mais fácil encontrarem-se pontos de acordo, embora a solução pelas parcerias público-privado neste sector se tenham revelado ruinosas, não só para os cofres do Estado como para os seus utilizadores. Assim sendo, valeria a pena iniciar-se um processo com estas caracterÃsticas pelo menor denominador comum até a imperfeição da fracção se aproximar o mais possÃvel da unidade. Embora o ambiente polÃtico no seio da União Europeia, depois das eleições de 7 de Junho, não seja particularmente favorável a um desenvolvimento deste tipo, a situação económica e social e a distensão conseguida com a eleição de uma nova administração nos EUA tornam potencialmente exequÃvel uma alteração polÃtica com implicações tão significativas. E à semelhança da queda da mais antiga ditadura europeia em 1974, que serviu de exemplo a gregos e espanhóis e à derrota de coronéis e falangistas, bem podia acontecer que a esquerda europeia olhasse para o exemplo português como fonte de inspiração.
A não ser por um incontrolável e obsessivo impulso, dificilmente se regressa ao lugar onde se foi infeliz. É por isso que também dificilmente se repetirá o cenário polÃtico de 1995 e 1999, em que uma maioria de deputados de esquerda e do centro-esquerda não chegou sequer a um entendimento mÃnimo com incidência parlamentar, tendo-se seguido aquilo que ficou conhecido pelo “pântanoâ€. Desta vez, se isso vier a acontecer, “alguém devia tocar-me para sentir que estou vivoâ€, só para citar o poeta.